Num desses domingos fui ao Mosteiro São Bento para a missa com canto gregoriano e órgão. É um desses passeios obrigatórios em São Paulo e entendi o porquê. O mosteiro estava cheio, pessoas sentadas no chão, pessoas de pé, e durante toda a missa reinava um silêncio incrível do público enquanto ressoava por cada parede o som dos tubos do órgão e as vozes de pouquíssimos homens que se multiplicavam pela igreja. Foi belissimo ouvir aqueles sons numa manhã calma de domingo em São Paulo, e ver tantas pessoas em comunhão pronunciando juntas as mesmas frases de fé.
Toda vez que vou a um culto religioso é assim, raramente não vejo ali beleza, seja na roupa das pessoas, seja em suas vozes, em suas músicas, em seus templos, porém há sempre uma esfera que permanece impenetrável para mim. E não é porque acredito em X e por isso não consigo acompanhar os que acreditam em Y, não sei como seria um judeu praticante num culto católico, por exemplo, mas não é assim que me sinto. O desajuste é um pouco maior. Não é que eu não acredite no culto de imagens e acredite em vida após a morte, não é que eu acredite em reencarnação e não no progresso visando o Nirvana. Eu simplesmente não acredito.
Pode parecer um assunto bobo, mas não é. Viver numa sociedade em que muitos acreditam e não acreditar gera conflitos internos bastante interessantes, para dizer o mínimo.
Meus pais não me batizaram, eles não são praticantes de nenhuma religião, os chamados agnósticos. Embora visitar a igreja de Nossa Senhora Aparecida no interior tenha sido parte de algum roteiro de viagem, promessas sejam feitas em troca de algum beneficio do "divino", e exista um certo panteísmo na minha educação, meus pais sempre acreditaram que deveríamos, meu irmão e eu, ter a liberdade de escolher nossas crenças quando achassemos mais conveniente.
Pelas circunstâncias da situação da educação no país acabei estudando parte da minha vida em colégios religiosos, ambos católicos, nos quais tinha as chamadas aulas de religião, que misturavam uma proto-catequese com pseudo-discussões sobre assuntos como homoafetividade e aborto. Assim. Só coisa leve e pouco ideologizante. Lembro-me até hoje, no ensino médio, de uma discussão sobre aborto e de uma sobre eutanásia nas quais eu devo ter sido a aluna mais chata da vida daquelas professoras. Eu simplesmente não conseguia concordar com o que elas diziam e fazia questão de deixar isso claro.
Durante anos eu busquei a fé. Estudei sobre algumas religiões. Por alguns anos, entre os 13 e uns 16 anos de idade, me interessei bastante pelo judaísmo, lia tudo que havia sobre o assunto, frequentava o Centro de Cultura Judaica e aprendi muita coisa. Hoje não me interesso pela religião, mas a cultura judaica ainda me fascina muito. Convivi com budistas, frequentei centros espíritas e sessões de mesa branca, li Violetas na Janela, fiz um curso para católicos na escola fora do horário escolar durante um ano, li muito da Bíblia católica, visitei algumas igrejas protestantes, enfim, eu procurei e achava que em algum momento eu encontraria.
Outro dia fui a um casamento católico celebrado por um padre bastante interessante que me fez ficar bastante chocada com pessoas que são capazes de casar na igreja apenas pela convenção da coisa. O casal em questão era de fato bastante religioso, mas sabemos como as coisas geralmente funcionam. Quero dizer, naquele momento você jura, você dá a sua palavra a coisas que você não acredita e sabe que não irá cumprir. Pareceu-me muito forte esse momento, eu não seria capaz de jurar em falso coisas do tipo, pareceu-me um desrespeito fazê-lo, um desrespeito às próprias convenções humanas e ao valor da palavra empenhada.
No fim acho que a fé é algo que se tem e pronto, ninguém tira de você e não sei até que ponto alguém, ou algo, pode colocá-la em você. Sem grandes intelectualizações, não acho mais que seja racional, eu não escolhi não acreditar. Eu não acredito e pronto. Quando as pessoas me perguntam por que eu não acredito em Deus eu não posso responder que é porque ninguém provou que ele existe, não posso dizer que Descartes não me convenceu (embora eu tenha sido bastante ingênua no meu primeiro ano de faculdade lendo feito uma louca as Meditações Metafísicas achando que no fim eu estaria convencida da existência de Deus para valer!). Não é nada disso, é uma coisa do sentir. Eu não sinto, e não só Deus, eu não sinto nada que vai além do que eu vejo ou compreendo racionalmente.
Na missa católica há um momento em que o padre apresenta a hóstia como sendo o corpo de Cristo e o vinho como sendo seu sangue, e naquele instante é corpo e é sangue de fato. A missa diz, ali: eis o mistério da fé. E é bem isso.
Toda vez que vou a um culto religioso é assim, raramente não vejo ali beleza, seja na roupa das pessoas, seja em suas vozes, em suas músicas, em seus templos, porém há sempre uma esfera que permanece impenetrável para mim. E não é porque acredito em X e por isso não consigo acompanhar os que acreditam em Y, não sei como seria um judeu praticante num culto católico, por exemplo, mas não é assim que me sinto. O desajuste é um pouco maior. Não é que eu não acredite no culto de imagens e acredite em vida após a morte, não é que eu acredite em reencarnação e não no progresso visando o Nirvana. Eu simplesmente não acredito.
Pode parecer um assunto bobo, mas não é. Viver numa sociedade em que muitos acreditam e não acreditar gera conflitos internos bastante interessantes, para dizer o mínimo.
Meus pais não me batizaram, eles não são praticantes de nenhuma religião, os chamados agnósticos. Embora visitar a igreja de Nossa Senhora Aparecida no interior tenha sido parte de algum roteiro de viagem, promessas sejam feitas em troca de algum beneficio do "divino", e exista um certo panteísmo na minha educação, meus pais sempre acreditaram que deveríamos, meu irmão e eu, ter a liberdade de escolher nossas crenças quando achassemos mais conveniente.
Pelas circunstâncias da situação da educação no país acabei estudando parte da minha vida em colégios religiosos, ambos católicos, nos quais tinha as chamadas aulas de religião, que misturavam uma proto-catequese com pseudo-discussões sobre assuntos como homoafetividade e aborto. Assim. Só coisa leve e pouco ideologizante. Lembro-me até hoje, no ensino médio, de uma discussão sobre aborto e de uma sobre eutanásia nas quais eu devo ter sido a aluna mais chata da vida daquelas professoras. Eu simplesmente não conseguia concordar com o que elas diziam e fazia questão de deixar isso claro.
Durante anos eu busquei a fé. Estudei sobre algumas religiões. Por alguns anos, entre os 13 e uns 16 anos de idade, me interessei bastante pelo judaísmo, lia tudo que havia sobre o assunto, frequentava o Centro de Cultura Judaica e aprendi muita coisa. Hoje não me interesso pela religião, mas a cultura judaica ainda me fascina muito. Convivi com budistas, frequentei centros espíritas e sessões de mesa branca, li Violetas na Janela, fiz um curso para católicos na escola fora do horário escolar durante um ano, li muito da Bíblia católica, visitei algumas igrejas protestantes, enfim, eu procurei e achava que em algum momento eu encontraria.
Outro dia fui a um casamento católico celebrado por um padre bastante interessante que me fez ficar bastante chocada com pessoas que são capazes de casar na igreja apenas pela convenção da coisa. O casal em questão era de fato bastante religioso, mas sabemos como as coisas geralmente funcionam. Quero dizer, naquele momento você jura, você dá a sua palavra a coisas que você não acredita e sabe que não irá cumprir. Pareceu-me muito forte esse momento, eu não seria capaz de jurar em falso coisas do tipo, pareceu-me um desrespeito fazê-lo, um desrespeito às próprias convenções humanas e ao valor da palavra empenhada.
No fim acho que a fé é algo que se tem e pronto, ninguém tira de você e não sei até que ponto alguém, ou algo, pode colocá-la em você. Sem grandes intelectualizações, não acho mais que seja racional, eu não escolhi não acreditar. Eu não acredito e pronto. Quando as pessoas me perguntam por que eu não acredito em Deus eu não posso responder que é porque ninguém provou que ele existe, não posso dizer que Descartes não me convenceu (embora eu tenha sido bastante ingênua no meu primeiro ano de faculdade lendo feito uma louca as Meditações Metafísicas achando que no fim eu estaria convencida da existência de Deus para valer!). Não é nada disso, é uma coisa do sentir. Eu não sinto, e não só Deus, eu não sinto nada que vai além do que eu vejo ou compreendo racionalmente.
Na missa católica há um momento em que o padre apresenta a hóstia como sendo o corpo de Cristo e o vinho como sendo seu sangue, e naquele instante é corpo e é sangue de fato. A missa diz, ali: eis o mistério da fé. E é bem isso.
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