sexta-feira, outubro 10, 2008

::O Pequeno conto do abraço::


Essa história se deu há cerca de seis meses, numa noite de garoa fina de São Paulo. Eu chorava compulsivamente sentada na sarjeta de uma calçada amontoada de gente na Av.Paulista. Respirei fundo e resolvi me levantar para seguir o caminho para casa, afinal, como diz a minha avó, "é melhor chorar em casa que é lugar quente".
Não podia sequer imaginar a minha face naquele momento, até hoje não posso, o desespero devia estar estampado num rosto borrado, rímel escorrido, cabelo desgranhado. Sem máscara, sem aprumo, sem espelho para retocar uma imagem que nunca fora a minha.
Segui lentamente até o ponto de ônibus, como se sentir aquela dor fosse meu dever, molhando-me daquela chuva que não traria a redenção. As pessoas me olhavam estranho, é verdade, mas desviavam o olhar rapidamente, com exceção do homem que se sentou ao meu lado e que parecia hipnotizado pela minha figura. Desci do ônibus na estação de metrô e continuei pelas escadas rolantes, tentando me controlar para que não saíssem ruídos escandalosos além das lágrimas. Até que senti uma batida em meu ombro.
Uma moça apenas alguns anos mais velha do que eu, num uniforme empresarial, pergunta-me se eu estava bem, eu segurei firme o lenço de papel, funguei fundo e disse sim,sim, está tudo bem. Ela olhou fundo nos meus olhos:
- Você precisa de um abraço?
Bom,eu rejeitei,achei a pergunta,inclusive,muita estranha. Mas não era uma pergunta, era quase que um afirmação, uma constatação. Ela então abriu os braços e me abraçou. Uma completa estranha, me apertou forte contra seu corpo quente e disse no meu ouvido palavras que jamais esquecerei:
-Não se preocupe,moça,vai ficar tudo bem.
Eu agradeci e fui embora.
A estranheza de tal gesto numa cidade como São Paulo, numa dinâmica social como a nossa, me chocou, afinal, é um gesto tão simples, que demanda tão pouco.
Quando cheguei à plataforma, olhei para os trilhos e pensei nas centenas, quiçá milhares de pessoas que se suicidam nos metrôs do mundo. Naquela noite eu não me suicidaria, a idéia sequer passou pela minha cabeça, eu não tinha planos, fatalmente iria para casa, tomaria umas gotas a mais de um remédio para ansiedade e conseguiria, enfim, dormir. Mas quantas pessoas desistiriam de se suicidar se recebecem um abraço de um completo desconhecido? Um abraço não paga as contas, não conserta corações partidos, mas reacende uma chama muito importante: a chama da esperança na humanidade das pessoas. O mundo pode ser uma merda, as pessoas se matam por nada, as pessoas se odeiam, os fortes se aproveitam dos fracos todos os dias,o mundo é injusto, mas são esses pequenos gestos que me fazem respirar fundo e sentir um pouquinho de alegria, um bem-estar diferente,uma humanidade que compartilho com alguns outros.