quinta-feira, março 28, 2013

Tempo Reverso

"Rua da União...
Como eram lindo os nomes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
... onde eu ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
... onde se ia pescar escondido."
Manuel Bandeira, trecho de Evocação do Recife


Há um lugarzinho em São Paulo, atrás da linha de trem, em que seis ruas paralelas só de casas e sobrados nos transportam para outra dimensão.
Ali eu imagino um senhor apressado morando na rua Calendário, um viajante do tempo chegando em sua super máquina na rua Tempo Reverso, um casal apaixonado caminhando de mãos dadas na rua Sinfonia Branca, enquanto um casal se separa após anos de amor na rua Cantiga do Desencontro. Uma adolescente confusa olha para as opções que tem diante de si na rua Ramo de Rumos, e um astrônomo faz pesquisas sobre solstícios e equinócios na rua Relógio de Sol.
Desde que descobri esse lugar espremido ao sul por um murão da CPTM, a norte por um condomínio de prédios, a oeste por um viaduto e a leste por uma fábrica, ficava me perguntando de onde saíra nomes tão bonitos para ruas. Eu, que moro numa praça com nome de santa e que cresci numa rua com nome de um tal doutor-não-sei-das-quantas-que-não-aparece-no-google, sempre sonhei com uma cidade na qual uma avenida enorme se chamaria Manuel Bandeira e aos políticos restaria, quando muito, as pequenas ruas. 
Em São Paulo a família Maluf dá nome a metade da parte sudeste da cidade, há ruas importantes com nomes de brigadeiros, marechais, coronéis e batalhas da Guerra do Paraguai, uma rodovia chamada Castelo Branco (e não é o castelo de uma princesa), enquanto Guimarães Rosa e Vinícius de Moraes são ruas mirradinhas que quase ninguém reconhece quando passa por perto. 
Há paulistanos sortudos que moram na rua Três Cantos Tupis, na rua da Saudade, rua Amizade do Tatuapé, enquanto outros muitos sequer sabem quem foi o fulano que dá nome a seu endereço, ou professam fé diferente da do santo que vem abaixo de seus nomes nas correspondências.
Se você pudesse mudar o nome de sua rua, qual escolheria? 
Em tempo, os nomes das seis ruas paralelas, que ficam na Lapa, são uma homenagem ao poeta paulistano Paulo Bomfim, e são nomes de algumas de suas obras. Entre outros títulos seus, estão lindos nomes para ruas: Poema do Silêncio, Armorial, Colecionador de Minutos, Praia de Sonetos, Súdito da Noite e Tecido de Lembranças.

Apesar de chamar os nomes de bizarros, que eu qualificaria como maravilhosos, o blog Pensar Enlouquece, de Alexandre Inagaki, tem um post incrível sobre nomes de ruas baseados em músicas e outras coisas mais legais do que nomes de políticos e engenheiros: 
http://pensarenlouquece.com/os-nomes-de-ruas-mais-bizarros-google-street-view/