sábado, dezembro 31, 2016

Retrospectiva de um retorno de Saturno

Se olharem no menu ao lado, verão que em 2016 eu bati o recorde de menos vezes em que escrevi neste blog desde 2007. 

No ano que começa, esse site aqui faz 10 anos, e espero ter mais tempo para escrever, e mais coragem para publicar o que escrevo. É uma daquelas resoluções de começo de ano que nunca se concretizam: escrever mais para mim, escrever mais para os outros, postar mais o que escrevo, escrever contos, fazer um curso de escrita criativa...

Por enquanto, resolvi escrever sobre este ano aqui que está quase acabando. Tem gente escrevendo textão no Facebook sobre o que fez e o que não fez, e tem gente reclamando de quem está escrevendo sua retrospectiva. O fato é que eu li todas que apareceram em minha TL, e algumas me fizeram chorar. Não há como negar, é nesta época do ano que paramos para pensar, nem que seja no tempo de uma ducha gelada para aplacar o calor, sobre o que fizemos ao longo do ano, sobre o que queríamos ter feito e não fizemos, sobre no que evoluímos e sobre como pode ser o ano que começa.

Essa coisa de ano, dia, hora, é tudo convenção. Eu sei. Mas não dá para fugir de todo esse sentimentalismo que paira no ar mais ou menos desde o dia 22 de dezembro. É triste, é melancólico, é narrado pelo Cid Moreira. 

Como plantonista de fim de ano, resolvi esperar o último segundo de 2016 para falar alguma coisa dele. Vai que no apagar das luzes ele resolve botar uma catástrofe, um ataque terrorista, um cantor morto bem no meio do caminho entre o passar o crachá na catraca da redação e o pegar as chaves da porta da minha casa.

Bom, lá vai. 

Hoje eu recebi uma mensagem de Whatsapp de uma amiga: "quero te dizer que vi em 2016 vc se transformar em uma mulher leve, divertida e aberta ao mundo. É muito lindo poder ver isso acontecer." 

E foi isso mesmo. Foi um ano de profundas transformações. Foi o ano do retorno de Saturno.

Mas 2016 foi quase que a consequência direta de algumas decisões, difíceis decisões (aqui, leia-se também, muito dinheiro gasto na terapia) que tomei nos últimos meses de 2015. Foram decisões que levaram anos para amadurecer na minha cabeça (anos, muitos dias sozinha na China e muita dor) e eu sabia que elas ajudariam a trazer modificações relevantes na minha vida. Eu só não imaginei que seria tanto assim.

Eu sei que 2016 foi um ano de merda para o mundo, para o Brasil, na política, para os direitos humanos e tudo mais. Eu sei que o Bowie morreu, que o Cohen morreu. Mas para ler sobre isso você pode ir no seu site de notícias, ou de factóides, favorito. Eu quero é escrever sobre mim, e sobre os meus.

Foi um ano de muitas primeiras vezes. No começo de 2016, fui pela primeira vez a uma astróloga. Ela me falou sobre o retorno de Saturno -que duraria até dezembro (ainda bem, chega!)- e avisou sobre junho (seria o mês mais difícil do ano, E FOI!). Pela primeira vez eu joguei futebol de forma minimamente organizada (numa quadra, numa equipe, uma vez por semana), senti como se chutasse uma bola pela primeira vez, será? Pela primeira vez eu tive uma paixão de carnaval, que começou, aconteceu e acabou como o carnaval: divertido, meio bêbado, gostoso e rápido. Pela primeira vez eu me apaixonei viajando de férias, pela primeira vez me apaixonei por um estrangeiro, e tudo deu errado, de uma forma cruel e desnecessária, que fez eu me sentir uma estúpida, dessa vez em duas línguas. 

Eu confundi sexo com amor, eu confundi sexo com amizade e amizade com amor, e tudo isso vice-versa.

Eu consegui me afastar de um amigo muito importante na minha vida, que me ajudou a ver coisas muito importantes, a quem eu amava muito, mas que não suportava me ver naquilo que eu me transformei, ainda que tenha sido com a ajuda dele, que me queria ver para sempre uma adolescente espirituosa, contestadora, metida a diferente.

Eu sofri de saudades, de amigos que foram morar longe, e de um amor platônico que resolvi deixar dentro da caverna para sempre enquanto eu saio para a luz. 

Pela primeira vez eu troquei as cordas de um varal de teto, arrumei torneira pingando, troquei puxador de porta, botei gente para fora da minha casa. 

Eu olhei para minha perna se movimentando e pensei: caramba, eu preciso fazer exercício e firmar essa coxa aí. E eu me enchi de coragem, coloquei números no papel, chequei minha conta bancária e voltei a fazer esgrima (com o futebol, acho que vai resolver o lance da coxa). Eu passei a mão no meu rosto e pensei: caramba, cadê aquela oleosidade? E passei a seguir uma rotina de cremes e protetor solar. São os 30 chegando.

Eu passei a dormir em todo e qualquer filme a que eu assista em casa, seja dia ou noite. Então passei a ir mais ao cinema. Eu passei a dormir depois de quatro ou cinco páginas de um livro, e para isso ainda não arranjei uma solução. Eu fui em dois casamentos na mesma semana, de gente que eu amo, e chorei igual criança. Eu me reaproximei de pessoas queridas das quais eu já não tinha mais nem o número de telefone. Eu pensei em procurar um antigo amor avassalador, e desisti.

Em 2016 o Renan veio (tem um texto em rascunho aqui no blog só sobre isso) e eu pensei por algumas horas que tinha 16 anos de novo, que íamos ao Bocage, a boates miadas, com RGs falsos. Meu coração se encheu de amor por saber que amizades como a nossa nunca acabam ou se perdem pelo tempo e espaço.

Eu fiz as pazes com as minhas opções de trabalho, com o fato de ter estudado uma coisa e trabalhar sempre em outras coisas. Eu fiz as pazes com a minha orientação sexual, e com a minha vontade de gritar e lutar para que todos também possam conseguir isso.

Eu fui idiota, muitas vezes. Eu falei o que não devia, muitas vezes. Escutei o que não queria. Eu fui cínica, como fui nos outros anos, mas fui sincera, como fui poucas vezes.

A mesma amiga da mensagem, há coisa de um mês, me mandou outra: "Cê tá apaixonada né?". E depois: "Tá reclamando menos das coisas em geral". E é assim que termino 2016, sem muitas reclamações, porque acho que cresci, que melhorei, porque minha vida, pela primeira vez, está menos bagunçada que minha mesa de trabalho, e também porque estou com olhos -e boca, e nariz, e mãos e tudo mais- que amam.


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